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Rimas visuais: o Cinema flertando com a Poesia

Entenda como o Cinema pode rimar cenas, criando sentidos e simbolismos em sua narrativa.

há 6 anos 1 mês

O cinema, como arte moderna, sempre teve uma grande abertura para interagir livremente com as diferentes manifestações artísticas. Aplicou a teoria das cores utilizada pelos pintores quando ganhou cor, incorporou números musicais em suas narrativas quando ganhou som… Mas além dessas interações mais “genéricas”, é possível estabelecer uma conexão do Cinema com a Poesia a partir das rimas visuais.

A utilização de rimas visuais é um recurso que resgata elementos de cenas passadas e os incorpora na atual. Pode ser um movimento, enquadramento, cenário… Contanto que nos remeta a um tempo ou lugar anteriormente estabelecido no filme.

O editor Pablo Fernandez, ciente da presença de rimas visuais em duas grandes trilogias, Jurassic Park e Star Wars, fez um compilado dessas cenas visualmente semelhantes, colocando-as lado a lado.

No caso de Jurassic Park, o diretor Colin Trevorrow (Jurassic World) decidiu homenagear a trilogia original, dirigida por Steven Spielberg e Joe Johnston. Em Star Wars, George Lucas optou por utilizar rimas visuais em sua Nova Trilogia, sempre referenciando os três primeiros filmes da franquia. Em uma cena do making-of dos novos capítulos da franquia, o diretor declarou: “você vê o eco do destino disso tudo. É como poesia, então eles rimam”.

Além de despertar essa sensação de nostalgia quando presente nas franquias, as rimas visuais podem funcionar também dentro de um único filme. É o caso de Me Chame Pelo Seu Nome (Call Me By Your Name) - que concorre ao Oscar desse ano em quatro categorias: Filme, Ator, Roteiro Adaptado e Música Original.

No caso do longa, as rimas estão presentes mais na mise-en-scène e movimentos dos personagens do que nos próprios enquadramentos. Seus gestos evocam momentos passados no filme e trazem para aquele ponto da narrativa um simbolismo anteriormente estabelecido, dando, então, um propósito mais do que estético para aquela repetição, indo além de um fan service.

Vamos analisar, então, uma das rimas presentes no filme. Oliver, um acadêmico que estuda Heráclito e que se aproximou, naquele verão, do estudo de estátuas, quando se depara com uma recém emergida do mar, desliza suavemente seus dedos sobre a face da peça - com curiosidade, para descobrir sua textura, curvas e rigidez.

Minutos depois, Oliver repete o mesmo gesto com Elio, segundos antes de beijá-lo. A mesma curiosidade e atmosfera de descoberta, de imediato, são evocadas. Naquele momento, Elio, além do destino da paixão de Oliver, se aproxima do que seria um objeto de estudo que está sendo analisado empiricamente. A devoção do acadêmico para uma peça tão perfeitamente trabalhada, que era a estátua, agora está realocada no garoto.

E se naquele momento Elio é avaliado e venerado como uma estátua, mais a frente temos outra associação entre o personagem e a peça emergida. No caminho de volta para sua casa, enquanto chora no carro dirigido sua mãe, Elio posa como a mesma estátua analisada anteriormente por Oliver.

Para o espectador médio, tudo isso pode parecer uma mera coincidência, mas é importante lembrar que na arte nada é por acaso. E mesmo que, por ventura, o diretor ou os atores não estivessem cientes dessa associação durante a gravação da cena, o filme, como obra que será lida (e não apenas assistida), existe independentemente das intenções de seus produtores. Isto é, todas as teorias que se justificam na tela, independentemente da opinião de quem produziu o longa, são tão valiosas quando as de sua própria equipe.

Abaixo você pode conferir um vídeo que compila essa e outras rimas visuais do filme. Lembrou de alguma franquia ou produção que também utiliza desse recurso para enriquecer sua narrativa? Conta pra gente aqui nos comentários.

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Autor(a) do artigo

Rafael Alessandro
Rafael Alessandro

Professor, coordenador e produtor de conteúdo no AvMakers. Rafael Alessandro é formado em Comunicação, graduando em Cinema e Audiovisual e mestrando em Cinema e Artes do Vídeo pela Faculdade de Artes do Paraná.

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