Cinema

O estilo da sua produção

há 4 anos 7 meses

Uma produção é uma ideia, mas nem sempre a sua ideia tem uma forma logo que sai do papel.

Quando a gente pensa numa produção, de maneira geral, ela é uma ideia ainda muito geral sobre como tudo vai funcionar e como cada coisa ocupa seu lugar dentro do contexto geral: luz, cenário, som, direção de arte, as coisas ainda estão caminhando muito aleatoriamente, ainda que falem sobre um mesmo tema.

Contudo, uma das coisas que deve ser entendida é que o todos esses fatores vão influenciar ao mesmo tempo o público que consome o seu conteúdo. Cada item daquilo que você desenvolve, estabelece uma forma de diálogo com um aspecto único da audiência.

A criação do clima em que seu filme ou produção vai se passar vai depender, assim, do sincronismo que esses elementos vão ter: se ele vai ser um alegre show anos 60, como Hairspray (2007) — em que todas as cores e a musicalidade estão juntas—, ou uma peça dramática como O Artista (2011) — que tem seus momentos mais voltados ao drama —, depende única e exclusivamente do estilo que você vai adotar.

O que é ter um estilo?

Antes de determinar como chegar a um estilo é interessante saber o que é um, e vale dizer que essa é uma palavra um tanto quanto difícil de definir.

Estilo, em sua origem, fala sobre algo que aponta uma direção, ou ainda sobre os objetos que se utilizava para escrever em tábuas de argila.

O sentido mais recente de estilo se utilizam desse conceito para estabelecer algo mais amplo: dentro do audiovisual, por exemplo, o estilo vai ser justamente o sentido em que sua obra vai apontar e que marcas ela causa no seu público.

O conceito, assim, passa por todas as fazes da composição audiovisual, do roteiro à edição — ainda que seja mais observável em certas partes — e segue alguns parâmetro que, embora não sejam fixos, são orientadores necessários dentro da obra.

Decida o tom do seu projeto

Agora sabendo o que é o estilo, uma vez que você já tem seu roteiro ou briefing em mãos, é hora de entender qual é o melhor mood ou clima que o define — e não necessariamente qual seria o mais “legal” para se fazer. Isso não significa podar sua criatividade e estabelecer uma norma, mas para que a linguagem e o mood adotados façam sentido com a história que vai ser contada.

A Forma da Água (2017) é um desses filmes que utiliza o sombrio clima de tensão da Guerra Fria para criar um filme denso e que faz uso da cor, por exemplo, como fator narrativo. O constante clima de tensão, típicos da época, é traduzido em um filme no qual a imagem é quem mais conversa com você (a melhor forma) usando literalmente uma pessoa muda para te falar isso (o mais “legal” a ser feito). Isso deu o tom ao filme.

E quando se fala em tom, não é tão somente o assunto cor que está em jogo, mas a forma que o material vai ser exibido: algo mais próximo de um romance, ou mais para um documentário, ou ainda mais agitado como um filme de ação, ou quem sabe algo mais vagaroso como uma novela. Tudo está em jogo quando se fala em tom porque cada um desses desenvolve um estilo muito próprio.

Depois que você define qual é o tom que você vai querer no seu projeto, todos os passos que vem a seguir são baseados nele e confirmam o seu propósito.

A escolha do seu equipamento

Filmes e produções que tem uma pegada mais voltada para a ação, como Tropa de Elite (2007), se utilizam mais da câmera “na mão” para criar o ambiente de ação: a falta de estabilidade e o borrão que isso causa na imagem trazem uma falta de ar constante para o filme, um dos segredos dos filmes de ação.

Grandes imagens com paisagens de tirar o fôlego, por sua vez, utilizam gimballs ou mesmo gruas para suavizar os movimentos e criar um ambiente e um mood mais calmo para aquilo que estão retratando.

Na Natureza Selvagem (2007) é um desses filmes cheios de imagens de paisagens grandiosas e abertas.

As lentes e os enquadramentos que serão usadas também vão influenciar na linguagem e no modo como sua história será recebida pela sua audiência, e tudo isso contribui para o seu estilo. Uma lente mais aberta é ideal para captar mais itens e denotar a grandeza do ambiente, enquanto lentes mais fechadas podem ser usadas para captar detalhes—cada uma delas podendo ser utilizada para criar sensações diferentes no público.

Em O Discurso do Rei (2011), o deslocamento do Rei George VI do Reino Unido é mostrado através de takes abertos em que tudo está em foco e nos quais o Rei — naturalmente uma figura que carrega a majestade do seu título — aparece deslocado do centro e pequeno, uma forma de posicionar a personagem com a sua problemática: sua gagueira.

E utilizando o mesmo filme como referência, o som nele é importantíssimo para a mensagem que se quer criar: O Discurso do Rei trabalha com captações sensíveis e que recriam a experiência da voz com o público. Tudo isso devido ao equipamento certo e ao uso do equipamento — nosso próximo tópico.

O Uso do Equipamento

Saber quais são as capacidades do equipamento que está utilizando, bem como ele pode ajudar a contar sua história, são fatores que pesam no estilo de uma produção.

Em Ela (2011), o desenfoque das lentes, assim como o trabalho de colorização da pós — os computadores e softwares também fazem parte do seu equipamento, ainda que não estejam dentro do set —, contribuem para a construção da mensagem desenvolvida pelo filme: a paixão solitária de um homem por uma inteligência artificial.

A maneira em que algumas cenas só ele está em foco é o exemplo no qual o equipamento correto foi utilizado da maneira correta para transmissão da mensagem a que o filme se propunha.

A importância da pós

E em se tratando da pós-produção, ela é uma das partes que mais cuidado deve ter porque ela dá o formato real ao estilo que foi pensado para a produção.

Os cortes, a cor, a sequência, todos serão itens determinantes em relação à concordância que todos os itens estilísticos da história têm.

Em Dunkirk (2017) a montagem do filme é o elemento estilístico de peso para criação do mood da história: como as narrativas são contadas e como a não-linearidade é utilizada contribuem para o clima vivido na Batalha de Dunquerque em plena Segunda Guerra Mundial.

Então, se a sua cena de ação precisa de um pouco mais daquela falta de ar, talvez seja interessante um speed ramp, como a gente já ensinou aqui no blog. Ou ainda, se você precisa de um choque em sua cena, talvez usar o contraste da cor, como também já falamos por aqui, seja a melhor alternativa. Esses efeitos ainda podem ser somados a cortes secos e rápidos para a criação de um clima tenso ou aflitivo.

O som, nesse contexto, também é um fator que, na pós, exerce uma função essencial dentro da sua produção. Como e quando ele aparece, além da qualidade que ele aparece, são detalhes que fazem diferença entre um projeto que está bem alinhado e tem um estilo muito próprio e algo que tem suas partes muito bem trabalhadas de maneira independente, mas não se casam.

Todas essas partes, trabalhadas em conjunto e separadamente pela Direção, Direção de Arte, Direção de Fotografia e Edição, serão a linha de frente na determinação do que definirá o seu projeto em estilo e na forma que seu público vai captar a mensagem.

Autor(a) do artigo

João Leite
João Leite

Escritor e redator, formado em Rádio e Televisão pelo Complexo FIAM-FAAM, apaixonado por literatura e observador míope do espaço sideral.

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