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O documentário clássico

Confira as diferenças entre o cinema ficcional e o documentário, além de aprender as diferenças básicas entre o documentário clássico e o moderno.

há 3 anos 8 meses

O documentário como conceito dentro do cinema surge no final dos anos 1920 com uma conotação representacional - um material que comprova que determinado fato realmente aconteceu. Apesar de ser considerado por muitos como um gênero cinematográfico, ele não é constituído por convenções de gênero - que compõem essa categorização dentro da teoria cinematográfica.

Sua principal reivindicação, como aponta Francisco Teixeira em Documentário Moderno, era “como conhecer, formar, educar com os meios postos à disposição pelo cinema”, encontrando, então, uma alternativa a um cinema que havia herdado esses procedimentos do teatro e da literatura.

É a partir dessa diferenciação de procedimentos que surge a cisão entre o que hoje conhecemos por cinema ficcional e cinema documentário. Mas apesar de suas diferenças, ambos possuem um “ideal de verdade”: “a verdade como revelação de algo imerso na espessura, opaca ou transparente, do mundo, e a que se tinha acesso, fosse por meio de uma parafernália de artifícios do cinema ficcional, fosse pela visão límpida e direta do cinema documental” (Teixeira).

David Bordwell e Kristin Thompson, em A arte do cinema: Uma introdução, defendem que apesar de se colocar no mundo como um material que apresenta informações fatuais, o documentário pode fazer isso de maneiras tão diversas quanto a ficção - recorrendo, inclusive, à encenação, que é tão cara ao cinema ficcional.

Quanto as formas argumentativas na construção de um documentário, temos um artigo no blog específico para isso - abordando a forma categórica e a forma teórica. Já tratamos, inclusive, das questões éticas do documentarismo. Mas quais são os principais diretores do cinema documentário clássico e quais foram suas propostas?


O documentário clássico era visto até o final dos anos 50 apenas como uma mera oposição ao cinema ficcional. Mas para além dessa recusa à ficção, esse documentário se subdividiu entre o documentário (etnográfico) e a reportagem (investigação). Com alguns propósitos semelhantes, eles seriam capazes de nos fazer ver personagens e situações, e ainda nos fazer ver a partir desses personagens ou dessas situações, cada um com uma abordagem diferente.

Mas antes disso, Robert Flaherty, em seu método de observação participante, ao registrar a vida de uma família esquimó em Nonook, o esquimó (1922), inaugurou o que hoje tratamos como a relação do documentarista com o outro: “primeiro exótico/distante, depois familiar/próximo” (Teixeira).

Em um gesto antropológico, ele foi a campo e realizou contato direto com seus personagens. Mas isso não livrou seu filme de estratégias ficcionais, como o uso de uma atriz para interpretar a esposa de Nanook, a construção dramática de cenas - como a caça à foca - ou até mesmo o uso de cenários artificiais - como quando Flaherty substitui um iglu por sua metade, para privilegiar a iluminação do espaço.


No mesmo período, ainda dentro do que classificamos como documentário clássico, Dziga Vertov propunha, como aponta Teixeira, “que a câmera não era apenas um olho exteriorizado, objetivado, o que lhe daria um poder de simples reprodução, mas que ultrapassava em muito o olho humano em suas funções perceptiva e cognoscitiva”.

Diferente de Flaherty, com o seu cinema-verdade, Vertov buscou a não roteirização e não encenação, evitando ao máximo que sua câmera interferisse no “improviso da vida” que ele se propunha a registrar.

Seu cine-olho pretendia “não ‘filmar a vida de surpresa’, só pela ‘surpresa’, mas para mostrar as pessoas sem máscaras, sem maquiagem, para pegá-las através do olho da câmera num momento em que não estivessem atuando, para ler seus pensamentos, despidos pela câmera” (Vertov).

Rompendo com as estruturas teatrais e literárias transpostas para o cinema, ele buscava uma libertação dessas formas narrativas que “prejudicavam o potencial do cinema de ajudar a construir uma nova realidade visual e, com ela, uma nova realidade social” (Nichols).


Referências

Livros: A arte do cinema: Uma introdução, de David Bordwell e Kristin Thompson História do cinema mundial, de Fernando Mascarello Introdução ao documentário, de Bill Nichols

Filmes: Nonook, o esquimó (1922), dirigido por Robert Flaherty Um homem com uma câmera (1928), dirigido por Dziga Vertov

Autor(a) do artigo

Rafael Alessandro
Rafael Alessandro

Professor, coordenador e produtor de conteúdo no AvMakers. Rafael Alessandro é formado em Comunicação, graduando em Cinema e Audiovisual e mestrando em Cinema e Artes do Vídeo pela Faculdade de Artes do Paraná.

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