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Gêneros cinematográficos e suas convenções

Conheça as convenções dos gêneros cinematográficos e como elas podem te ajudar a contar uma boa história, sem frustar o público e cair em clichês.

há 4 anos 1 semana

Os gêneros cinematográficos vão muito além de uma catalogação dos filmes para fins comerciais - seja na divisão das estantes das antigas locadoras ou nas diferentes abas de serviços de streaming. Cada gênero impõe em sua narrativa convenções próprias que são conhecidas do público, que por sua vez espera encontrá-las na tela.

Mas o que são convenções de gênero? Robert Mckee, em Story, define essas convenções como “ambientes, papéis, eventos e valores específicos que definem gêneros individuais e subgêneros”. Em tramas de desilusão se espera um final negativo, assim como em um faroeste fica fácil imaginar qual será a ambientação do enredo. Ou até mesmo as recorrências de eventos “clichês” em estórias de amor, ou personagens convencionais como o criminoso em estórias de crime.

O fato é que cada gênero cinematográfico moldou ao longo da história do cinema as expectativas da audiência, e a dica de Mckee é que os realizadores devem ser peritos no gênero que pretendem trabalhar e em suas convenções, para que possam antecipar as antecipações do público.

E aqui retomamos o propósito comercial dos gêneros cinematográficos. Uma boa promoção faz com que o público chegue à sala de cinema cheio de expectativas, certo do que quer e com um “apetite que desejamos satisfazer”.

Diferente do que se possa imaginar, essas convenções não são barreira impostas para impedir a criatividade do roteirista. Pelo contrário, Robert Mckee enxerga nelas uma “limitação criativa” produtiva, capazes de inspirar a criatividade, uma vez que o obstáculo é manter a convenção, mas evitar o clichê: “em vez de negar a convenção e tornar a estória insípida, o bom roteirista considera as convenções velhas amigas, sabendo que na luta para cumpri-las de maneira única, pode encontrar a inspiração para a cena que levanta a estória para além do ordinário”.

É preciso lembrar também que essas convenções são mutáveis - elas crescem, evoluem e se quebram conforme as mudanças na sociedade. Para o autor, os gêneros são apenas janelas para a realidade, várias maneiras para o roteirista olhar a vida. Ele cita três exemplos de evolução de gênero: o faroeste, o psicodrama e a estória de amor.

O faroeste originalmente ambientado no velho oeste apresentava em sua narrativa alegorias do bem contra o mal, mas a partir dos anos 80 tornou-se um semidrama social, “um antídoto para o racismo e a violência”.

Já para o psicodrama, Mckee aponta quatro grandes estágios evolutivos em suas convenções:

  • “Em seu primeiro estágio, um psiquiatra fazia o papel de ‘detetive’ para investigar um ‘crime’ escondido, um trauma profundamente reprimido que seu paciente sofreu no passado”.
  • “Porém, quando o assassino serial começou a amaldiçoar os pesadelos da sociedade, a evolução do gênero levou o psicodrama a seu segundo estágio, juntando-o aos filmes de Detetive em um subgênero conhecido como Thriller Psicológico”.
  • Em um terceiro estágio, “o próprio detetive transforma-se em um psicopata, sofrendo de uma grande variedade de doenças modernas - obsessão sexual, impulso suicida, amnésia traumática, alcoolismo”.
  • Em 1990 chegamos ao quarto estágio do gênero, com o deslocamento do psicopata para o cônjuge, psiquiatra, cirurgião, filho, babá, companheiro de quarto. “Esses filmes desarrolham a paranoia coletiva, quando descobrimos que as pessoas de quem somos íntimos, as pessoas em quem confiamos, aqueles que esperamos que nos protegessem, são na verdade maníacos”.

A estória de amor acumula convenções desde Shakespeare, onde Personagens-Obstáculo ou “a força oposta ao amor” são expandidos nos personagens dos pais em Romeu e Julieta. E essa convenção essencial se manteve inabalada desde 2300 a.C. até o século vinte, quando houve a revolução romântica. A música popular, a publicidade, ou qualquer outra narrativa de grande alcance estavam inundadas pela ideia do amor romântico.

A convenção dos “pais da garota” deixou de ser relevante e deu lugar a novas forças para se opor ao romance dos protagonistas. A diferença cultural, o racismo, a identidade sexual e a morte foram protagonistas nessa troca de paradigma. Mas o entusiasmo pelo romance que embalou o início do século não teve o mesmo impacto em seu final. Agora as narrativas lançavam um olhar obscuro e cético sobre o amor, destacando a falta de esperança e a impossibilidade de um amor duradouro.


Referências

Livros: Story, de Robert Mckee

Autor(a) do artigo

Rafael Alessandro
Rafael Alessandro

Professor, coordenador e produtor de conteúdo no AvMakers. Rafael Alessandro é formado em Comunicação, graduando em Cinema e Audiovisual e mestrando em Cinema e Artes do Vídeo pela Faculdade de Artes do Paraná.

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